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Publicado em 18/04/2017
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Estranho ato de solidariedade ao governador

Causa, no mínimo, estranhamento o ato de apoio a Paulo Hartung (PMDB) marcado para ocorrer na tarde desta segunda-feira (17). Segundo informação divulgada primeiramente pela Revista Veja, o ex-executivo da Odebrecht Benedicto Barbosa da Silva, o BJ, revelou que Hartung – vulgo Baianinho - teria recebido R$ 1,080 milhão em pagamentos indevidos da empreiteira em 2010 e 2012 para ajudar aliados em campanhas eleitorais.

A intenção de Paulo Hartung com o ato entre amigos seria dar sua versão sobre os últimos episódios envolvendo o seu nome, já bastante desgastado em virtude da crise da segurança pública deflagrada em fevereiro deste ano. O que não estranha, entretanto, são os organizadores, ou convidados, do "ato de solidariedade": empresários que compõem o Fórum das Entidades e Federações, Movimento ES em Ação, deputados, Amunes (Associação dos Municípios do Espírito Santo) e outras lideranças estaduais.

Não estranha, pois os grandes empresários do Estado são os maiores beneficiados da política do governador. Não por acaso, o secretário de Estado da Fazenda, Bruno Funchal, retorna à Assembleia Legislativa (Ales) mais uma vez para prestar esclarecimentos sobre a concessão de benefícios fiscais do governo a empresas instaladas no Espírito Santo, em especial à mineradora Vale.

O pedido da ida de Funchal para falar especificamente sobre incentivos concedidos à mineradora foi apresentado à Comissão pelo deputado Euclério Sampaio (PDT). O parlamentar pretende saber qual o montante de impostos que o governo deixa de arrecadar com a renúncia fiscal e a compensação da renúncia.

A falta de informações detalhadas sobre as benesses concedidas pelo governo estadual aos grandes empresários também levou o Ministério Público de Contas (MPC-ES) a requerer à Sefaz o detalhamento sobre concessão de benefícios e incentivos fiscais pelo Estado no período compreendido entre 1989 e 2016. Isso porque o governo descumpriu a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2017, na medida em que não especifica quem são os beneficiários de uma renúncia de impostos que supera R$ 4,2 bilhões. Ou seja, R$ 4,2 bilhões que deixarão de ser investidos em Saúde, Educação e Segurança.

Já o Movimento ES em Ação, berço do atual secretário da Fazenda, pode ser considerado o braço direito de Paulo Hartung. O grupo reúne a grande imprensa capixaba (Rede Gazeta, TV Vitória e TV Capixaba), empresas como ArcelorMittal, Fibria, Faesa, Fucape e, sem surpresa alguma, a Vale. Em uma relação duvidosa com o poder público, o ES em Ação pretende ditar todo o plano de desenvolvimento do Espírito Santo até 2030, tendo seus interesses empresariais como norte.

A Amunes, por sua vez, é uma associação de prefeitos em que Paulo Hartung figura como mandatário. Ainda assim, seu grupo ousou dizer à imprensa que se preocupava com a politização da entidade na última campanha à presidência, findada em 28 de março com a vitória de Guerino Zanon (PMDB). O que preocupava o governador, na verdade, era que uma chapa mais alinhada a Renato Casagrande (entre os quais Gilson Daniel, do PV, e Audifax Barcelos, do REDE) vencesse a eleição e tirasse seu domínio da Amunes.

Mas dispondo de um modus operandi bastante conhecido no meio político capixaba, baseado em ameaças a políticos que ousarem descumprir suas "ordens", Hartung rapidamente virou o jogo em favor de seu correligionário e agora pode controlar a entidade livremente - inclusive para que ela participe do estranho ato de solidariedade a um potencial investigado pela operação Lava Jato.

Por fim, também não estranha a presença de deputados estaduais no pleito. Desde o início do seu atual mandato (em 2014), Hartung domina com mão de ferro os passos da Ales. Por lá, define quais projetos serão votados e quando, quais serão aprovados ou rejeitados e quando deve haver sessões extraordinárias para aprovar, a toque de caixa, projetos de autoria do Executivo em regime de urgência.

A apropriação do poder público pelo poder privado é o objeto da maior operação anticorrupção já realizada no Brasil. Mas mesmo assim, de forma descarada, os “donos” do Espírito Santo se reúnem para objetivar seus (caros) interesses.

A sociedade não pode mais ficar refém dessas práticas. Deve cobrar, com afinco, a elucidação dos fatos e não deixar que uma teia formada por meia dúzia dite o seu futuro e decida o que deve ou não ser abordado nos jornais locais, de que forma, e quem eles vão eleger culpado ou inocente.

A DIRETORIA