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Publicado em 16/09/2021
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Reforma Administrativa continua retirando a estabilidade, ampliando corrupção, reduzindo serviços à população e mantendo supersalários

Mesmo após modificações feitas pelo relator deputado Arthur Maia (DEM-BA), que alardeou ter mantido a estabilidade, o novo texto não mudou muita coisa e está repleto de ferramentas para acabar com a estabilidade e blindar corruptos por meio de ameaças às/aos servidoras/es e até mesmo de ações de interferência em investigações da Polícia Federal 

As regras de transição previstas na Reforma da Previdência (PEC 32), que tramita na Câmara dos Deputados, em Brasília, não protegem as/os atuais servidoras/es, ao contrário do que tem sido dito. A insegurança quanto à questão é tão grande que até demissão por critérios nebulosos de desempenho podem atingir quem já está no serviço público. Mesmo tendo passado por mudanças na Câmara, o texto mantém seu DNA de ataque aos serviços públicos e desprezo aos brasileiros e às brasileiras que os utilizam.

Quem alerta para esses perigos não são apenas os sindicatos e opositores do Governo Federal e da política ultraneoliberal ultrapassada do Ministério da Economia, mas a Consultoria Legislativa do Senado Federal da Área de Direito Constitucional, Administrativo, Eleitoral e Processo Legislativo, além do Dieese. 

Estabilidade

De acordo com os técnicos do Senado, o Supremo Tribunal Federal (STF) tem entendimento de que não existe direito adquirido para servidor do regime jurídico vigente. Ainda no texto original, falava-se em um regime jurídico específico para atuais servidoras/es, mas sem nem ao menos esboçar qual seria. Além disso, lacunas deixavam as portas abertas para interpretações futuras. O parecer do Senado explica que o texto da PEC 32 prevê que os servidores atuais estarão sujeitos à demissão de acordo com o artigo  41 da Constituição Federal, mas não define se com a nova ou a antiga redação. A depender da interpretação futura, todo o funcionalismo público atual poderia entrar nas regras que, em tese, seriam apenas para novas/os servidoras/es.  

Sendo assim, chefias e políticos descontentes com o trabalho de servidoras/es que não se alinham aos seus interesses terão um instrumento poderoso de pressão e perseguição para utilizarem contra quem decide fazer o trabalho corretamente servindo à sociedade brasileira e não aos poderosos. Em documento divulgado no dia 2 de setembro, o Departamento intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) explica que, ao contrário do que foi alardeado após a publicação do texto do substitutivo na Câmara dos Deputados, em 31 de agosto, não houve melhoria. Ao definir quais são os cargos exclusivos de Estado, a proposta colocou todos os demais cargos da administração pública em uma espécie de limbo, abrindo a possibilidade para que o gestor escolha a modalidade de contratação dos futuros ocupantes dos cargos não exclusivos de Estado.  

Ainda segundo o Dieese, a avaliação de desempenho amplia as possibilidades de perda do cargo, pois incorpora a perda da estabilidade do servidor à previsão incluída pela Emenda Constitucional 19/1998. Esta emenda possibilita que determinado cargo seja extinto por ser definido como desnecessário ou obsoleto, na forma de lei específica.  

De acordo com a Consultoria do Senado, a PEC 32 vai permitir, caso aprovada, que leis ordinárias, de fácil aprovação nos legislativos do Brasil, possam extinguir direitos hoje garantidos às/aos atuais servidoras/es. A redação da Reforma Administrativa dará ao presidente, governadores e prefeitos o poder de reorganizar cargos públicos por decreto, sem a necessidade de consultar o Legislativo, sendo omissa quanto à inclusão ou não das/os atuais servidoras/es nessas mudanças via “canetadas autoritárias” do executivo.

Parecer na Câmara 

A PEC 32 teve o parecer do relator, deputado Arthur Oliveira Maia (DEM/BA), apresentado no dia 31 de agosto de 2021. Apesar de ter sofrido importantes mudanças, a PEC 32 continua sendo um ataque aos servidores públicos e à sociedade que depende desses serviços. Agora há uma propagação da informação de que a estabilidade será mantida para todas/os as/os servidores públicos.  

Entretanto, o texto garante a estabilidade apenas para os chamados cargos típicos de estado. Seguindo o padrão de nebulosidade que envolve tudo relacionado a esta Reforma, o texto não define quais serão esses cargos, como alertou o Dieese. Além disso, não haverá estabilidade para contratações simplificadas e de tempo determinado. E, não por acaso, essas serão as modalidades preponderantes nas novas contratações. Na prática, a estabilidade acaba para quase todas/os as/os novas/os servidoras/es e continua não havendo garantia para os concursados.

 Fim dos concursos 

O texto modificado também não prevê obrigatoriedade de contratações por meio de concurso público, dando margem para apadrinhamento político e atendimento a interesses pessoais e eleitorais, abrindo as portas para pagar com dinheiro público cabos eleitorais durante anos e anos, mesmo fora dos períodos eleitorais. 

De acordo com o Dieese, o texto original da PEC 32 previa a criação de cinco novos vínculos de contratação, e o substitutivo do relator prevê apenas o cargo exclusivo de Estado (nova denominação do cargo típico de Estado) e o contrato por tempo determinado. O texto do relator prevê, ainda, a possibilidade de duração máxima de 10 anos para os futuros contratos, e esse tipo de contratação se dará pelo que o substitutivo chama de processo seletivo simplificado, sem definir o que seria esse processo. O trabalhador contratado como temporário será privado de uma série de direitos existentes hoje, como a garantia de salário nunca inferior ao mínimo, aposentadoria, seguro contra acidentes de trabalho e proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de 18 e de qualquer trabalho a menores de 16 anos. 

Além disso, o artigo 37 da PEC 32 regulamenta a participação da iniciativa privada no serviço público brasileiro. É importante desmistificar a fantasia da eficiência de tudo que é privado. Países como EUA, Alemanha e França, passam por processos de reestatização e desprivatizações de serviços essenciais e estratégicos, porque muitas concessões ao setor privado deram errado, encarecendo e piorando serviços que, em alguns casos, deixaram de chegar às pessoas que precisam deles. 

Ultrapassado e desconectado das diversas realidades do Brasil, o governo federal e o Congresso Nacional forçam privatizações. O que farão com o SUS e como ficarão as pessoas que dependem dele, por exemplo? Com certeza, você que lê esse texto, já deve ter tomado ao menos uma dose de vacina contra a Covid-19 pelo SUS, independentemente de sua situação financeira. 

Denúncias de corrupção 

O deputado Arthur Maia foi a público, junto com Arthur Lira (presidente da Câmara) e Rodrigo Pacheco (presidente do Senado), dizer que seu parecer “manterá direitos adquiridos e outros direitos” e que o seu critério foi “a melhoria dos serviços públicos”. Você acredita mesmo nisso? Alguém acredita nessa bondade toda de autoridades que apoiam um texto gestado pelo Governo Federal?

As denúncias de corrupção, reveladas pela CPI da Covid, deram prova irrefutável da importância da estabilidade no serviço público, pois as informações prestadas por servidores públicos de carreira foram fundamentais para o avanço das investigações. E as pessoas só falaram porque estão protegidas pela estabilidade que permite que elas se recusem a contribuir com práticas ilícitas e possam denunciar tais práticas, atendendo aos interessas do país e não aos das chefias nomeadas para beneficiar quem as nomeou. Para ficar bem na fita, o discurso dos parlamentares da base do governo agora é de manutenção da estabilidade. Mas, como já foi tratada neste artigo, a estabilidade não foi garantida de verdade. É só uma peça de ficção. 

E o texto ainda presenteia o governo federal. O primeiro presente aumenta o seu poder de arquivar processos contra si, pois proíbe a escolha de delegados da Polícia Federal pelo STF. Mesmo em casos abertos pelo STF, a escolha do delegado para as investigações fica a cargo do diretor-geral da PF, que é indicado pelo presidente. O segundo presente é a prerrogativa de foro privilegiado ao diretor-geral da PF.

É o pacote completo para a obstrução de investigações de corrupção e de atos contra o Estado Democrático de Direito, como, por exemplo, o inquérito das Fake News, que vai revelando ao país uma rede criminosa formada por apoiadores do presidente da República para atacar a democracia por meio da disseminação de notícias falsas e incitação ao desrespeito às instituições e ao ataque a qualquer autoridade ou figura pública que se oponha ao autoritarismo do Governo.

 

Supersalários são mantidos pela Reforma 

Estão fora da Reforma Administrativa e não perderão nenhum direito, incluindo generosos salários: militares, juízes, magistrados em geral e membros do ministério público. Não é difícil juntar os pontos para entender quais são os interesses atendidos por essa Reforma. Definitivamente, ela não atende aos interesses da classe trabalhadora do Brasil.  

O Dieese, no documento lançado no dia 2 de setembro, apresentou subsídios importantes para a continuação do debate sobre a PEC 32, informando que as mudanças que o relator, deputado Arthur Maia, fez no texto da PEC 32 ignoram demandas das/os trabalhadoras/es, uma vez que não mexem no núcleo e no sentido da Reforma em relação ao texto original apresentado pelo Executivo. As modificações não contemplaram as críticas feitas pela sociedade e pelo movimento sindical durante audiências públicas, e o documento mantém os principais pontos da proposta original. 

Além disso, o texto substitutivo vai além. Ele aprofundou diversos problemas que dizem respeito à precarização do serviço público e à possibilidade de demissão dos servidores atuais e futuros. O Dieese defende que é necessário que o movimento sindical se mantenha mobilizado e em diálogo com a sociedade e com os parlamentares contra a PEC 32, uma vez que ela coloca em risco a continuidade da oferta de serviços públicos para a sociedade, prejudicando especialmente os mais pobres e a classe média. 

Com informações do Dieese, do Senado da República e do Fonasefe.